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Universo paralelo do Big Data traz medos e surpresas

15 jun 2012 - 08h09
(atualizado às 08h15)
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Dennis Overbye

Não muito tempo atrás, uma mulher de Tacoma, Washington, recebeu uma sugestão do Facebook para adicionar uma outra mulher como amiga. Ela não a conhecia, mas concordou em adicioná-la, como muitos de nós já fizemos, espalhando inocentemente trilhas de nossas informações pelo ciberespaço. Pouco tempo depois, ela teria uma surpresa. Na página do perfil da outra mulher, estava o retrato de um casamento - dela e do marido da primeira mulher, agora exposto para todo o mundo cibernético como bígamo.

Banco mundial de informações digitais cresce a uma taxa de cinco trilhões de bits por segundo, e há muita coisa acontecendo que não conhecemos
Banco mundial de informações digitais cresce a uma taxa de cinco trilhões de bits por segundo, e há muita coisa acontecendo que não conhecemos
Foto: Elwood H. Smith / The New York Times

E assim segue a vida na era do chamado Big Data, na qual mais e mais informações sobre nossa vida - onde compramos e o que compramos, e de fato onde estamos no momento - a economia, os genomas dos inúmeros organismos aos quais ainda nem demos nome, galáxias repletas de estrelas que ainda não tínhamos contabilizado, engarrafamentos em Cingapura e o clima de Marte são processados cada vez mais e mais rápido por computadores cada vez maiores, ao alcance de todos, que são detentores de dispositivos com maior poder de processamento do que a central de controle da missão Apollo. O Big Data provavelmente sabe mais sobre nós do que nós mesmos sabemos, mas será que existem coisas que o próprio Big Data não sabe que ele sabe? O Big Data está nos observando, mas quem ou o que está observando o Big Data?

Talvez seja hora de sentir medo. Muito medo, sugere o historiador da ciência George Dyson, autor de uma biografia recente de John von Neumann, um dos inventores do computador digital. Em Um Universo de Códigos Autorreplicantes, uma palestra publicada no site Edge, Dyson diz que o banco mundial da informação digital, que cresce a uma taxa de cerca de cinco trilhões de bits por segundo, constitui um universo paralelo de números e códigos e vírus com uma "física" e uma "biologia" próprias.

Há coisas acontecendo dentro desse universo das quais não tomamos conhecimento, assinala Dyson - exceto quando ele produz surpresas desagradáveis, como fez durante o "flash crash" do mercado de ações em maio de 2010. E é melhor descobrir quais são elas.

Onde está Hari Seldon quando precisamos dele? Infelizmente, ele não é real - ainda. Hari Seldon, matemático e "psico-historiador" que descobriu as leis que regem a história e sociedade, foi a figura central da magistral trilogia Fundação, de Isaac Asimov. Os livros, cuja história se passa milhares de anos no futuro, seguem Seldon e seus seguidores em suas tentativas de preservar a civilização durante o colapso iminente do Império Galáctico.

Há algo ao mesmo tempo assustador e grandioso na ideia de que nossa vida faz parte de padrões e correntes ainda invisíveis para nós, como ciclos climáticos ainda não detectados pelos registros geológicos.

Ou talvez não tão grandioso assim: no romance As Sereias de Titã, de Kurt Vonnegut, toda a evolução humana e a história haviam sido manipuladas a distância para que um dispositivo com aproximadamente o mesmo tamanho e forma de um antiquado abre-latas de cerveja chegasse às mãos de um astronauta robô abandonado em uma nave espacial quebrada em Titã, uma das luas de Saturno.

No entanto, se pudéssemos descobrir esses princípios, teríamos como - devo dizê-lo? - dominar o mundo.

Tanto Paul Krugman, economista liberal ganhador do Prêmio Nobel e colunista do Op-Ed para o New York Times, quanto Newt Gingrich, o conservador ex-presidente da Câmara e candidato presidencial, já admitiram que, quando jovens, foram inspirados pelo sonho de ser Hari Seldon.

Alguns anos atrás, Krugman disse ao New Yorker que a sedução da ideia de descobrir essas leis foi o que o fez querer ser economista.

Talvez você pense que a "física" desses sistemas não deve ser um mistério, uma vez que fomos nós que os criamos. Mas isso não significa que nós sabemos o que eles vão gerar. Alan Turing, matemático e pioneiro da computação britânico cujo nascimento completa 100 anos neste mês, mostrou que mesmo uma simples rotina ou conjunto de instruções executada ininterruptamente pode produzir resultados complexos. Ela "pode (na verdade, ela vai) produzir demonstrações (e comportamentos) que não necessariamente temos como compreender", escreveu Dyson por e-mail.

As surpresas - que os teóricos da complexidade chamam de propriedades emergentes - fazem parte do jogo. As formigas sabem que estão em um formigueiro?

No filme de ficção científica Colossus: o Projeto Forbin, de 1970 - um dos favoritos dos cientistas da computação, incluindo Dyson - os cientistas criam uma rede de supercomputadores. A primeira coisa que Colossus descobre depois de ser ligada é que existe uma rede semelhante na União Soviética. Elas juntam forças e dominam o mundo.

Eu queria saber se ocorrem surpresas assim nos modelos de computador usados pelo mundo financeiro. Então, entrei em contato com outro admirador de Hari Seldon, J. Doyle Farmer, físico e teórico da complexidade do Instituto Santa Fe, no Novo México, e um dos fundadores da Prediction Co., que agora é de propriedade do enorme banco suíço UBS.

Segundo Farmer, a economia clássica falhou gravemente no fornecimento de dados corretos para que pudéssemos entender a nós mesmos. Assim, ele e outros estudiosos começaram a desenvolver modelos da economia baseados em agentes, perguntando como efetivamente o comportamento aparentemente aleatório de formigas individuais pode dar origem a formigueiros, com toda a sua vitalidade, forma e inteligência.

Isso funciona muito bem para as formigas, e é bonito pensar que podemos ter algo a aprender sobre nós mesmos com nossos pequenos amigos de seis patas enquanto eles transportam as migalhas de um outro piquenique. Mesmo que isso signifique que em nosso futuro não existe nada mais profundo do que um abre-latas de cerveja do século XXII.

The New York Times
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