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Jobs fala dos bastidores da criação do iPad e do iPhone

2 jun 2010 - 14h30
(atualizado às 18h12)
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Alexandre Cardoso
Direto da Califórnia

Na conferência D8 "All Things Digital", evento organizado pelo Wall Street Journal que reúne as figuras mais emblemáticas do mundo da tecnologia, o convidado nesta quarta-feira era a "entidade" que atende pelo nome de Steve Jobs. O momento é propício já que a Apple acaba de passar a sua histórica rival Microsoft em valor de mercado, dando claros sinais de uma mudança de poder no mundo da tecnologia.

CEO da Apple marcou presença na conferência All Things Digital, na Califórnia
CEO da Apple marcou presença na conferência All Things Digital, na Califórnia
Foto: Marcelo Tripoli / Especial para Terra

Steve Jobs, apesar da aparência abatida e muito magra devido à ainda recente experiência com o câncer, respondeu as perguntas feitas pelos jornalistas Kara Swisher e Walt Mossberg com muita firmeza, bom humor e uma paixão pelo negócio que em nada se assemelha à postura encontrada nos atuais executivos e presidentes das grandes empresas. Ele estava tão à vontade que contou até segredos sobre os bastidores do desenvolvimento do iPad e do iPhone.

Confira perguntas feitas pelos jornalistas e as respostas de Steve Jobs:

No último mês a Apple passou a Microsoft em valor de mercado. Como você vê isso?
Para quem está no mercado há muito tempo e conhece a história, é meio surreal, mas no final do dia não é isso que faz as pessoas comprarem os produtos da Apple, ninguém compra um iPad porque a Apple vale mais que a Microsoft.

Você imaginou isso acontecendo?
Quando voltei para a Apple, ela estava contando os dias para fechar as portas e quebrar. Achei que iria chegar lá e encontrar um monte de gente desmotivada, pois era o que eu imaginava que teria sobrado. E o que eu encontrei foi um grupo de pessoas extremamente competentes e tive que perguntar: o que vocês estão fazendo aqui? E eles responderam: "Nós ainda acreditamos nas seis cores", fazendo referência ao logo da Apple na época, com a maçã colorida. Acho que é isso que faz a Apple ser diferente. Mas é meio surreal, mesmo.

Você escreveu um texto chamado "Pensamentos sobre o Flash" onde faz críticas fortes à tecnologia Flash. Os produtos da Apple não vão ter Flash?
A Apple explora os vetores da tecnologia e faz as suas escolhas e apostas no que entende ser a tecnologia que irá prevalecer no futuro. Flash para mim está decaindo e acredito no HTML5. Hoje nenhum smartphone tem Flash e, quando tiver, vai durar pouco e já estará desatualizado. Quando abrimos mão de coisas, nos chamam de loucos. Foi assim com o disquete, com o leitor óptico no Mac Air e assim por diante.

Mas o que você diria para as pessoas que têm um iPhone ou iPad hoje e veem os buracos pretos nas páginas onde deveria ter algo em Flash?
Os buracos que vocês veem são normalmente de publicidade que, para o usuário, não faz diferença. Além disso, cada vez tem menos buracos, isso vai sendo resolvido. A decisão de não ter Flash foi técnica. Falamos com a Adobe alguns anos atrás e perguntamos se o programa iria rodar mais rápido, vimos que não e falamos para eles nos ligarem quando o Flash rodasse mais rápido. A Adobe que abriu fogo contra nós porque não queremos usar um de seus produtos. Eles ficaram nos matando na imprensa e por isso escrevi o "Pensamentos sobre o Flash". Os produtos enfatizam aquilo que achamos ser o mais importante, e acreditamos nas nossas escolhas. Se acertamos, as pessoas vão comprar. Se erramos não compram. Mas o que acontece é que as pessoas estão comprando, vendemos um iPad a cada três segundos e a minha preocupação agora é como fazer iPads em três segundos.

O que você pode dizer sobre a Foxconn? (a Foxconn fabrica, entre outros eletrônicos, os iPhones)
A Foxconn não é uma sweatshop que explora as pessoas em condições desumanas, eles têm piscinas, quadras e é até bem legal para uma fábrica. O fato é que 13 pessoas cometeram suicídio e temos que entender o que houve. Estamos lá com eles conversando sobre o problema para poder ajudar a resolver. Já tivemos casos aqui mesmo nos EUA de suicídios seguidos por imitação e o importante é entender razão.

Hoje vemos uma guerra entre as plataformas. A já antiga Apple e Microsoft, o Google agora, o Facebook. É uma guerra?
Não. Nunca nos vimos numa guerra pela plataforma. Talvez por isso tenhamos perdido contra a Microsoft no passado. Nós estamos e estivemos focados em fazer os melhores produtos possíveis e não em fazer plataformas.

Como o Google virou competidor?
Eles decidiram virar concorrentes, nós não. Um dia eu vi e eles eram concorrentes com seus telefones.

Você vai tirar o Google dos seus produtos?
Não. Eles são concorrentes mas não precisamos ser grosseiros. O mercado de consumo é assim. Nós focamos em fazer o melhor produto e o mercado aceita, julga e paga pelo produto que quer. Três anos atrás não existia aplicativo para telefone, quem decidia era a operadora e o iPhone mudou isso. O consumidor decide que aplicativo ele quer e isso fez a quantidade de informação que trafega pela rede ficar gigantesca.

Alguns anos atrás você disse que não entraria nos mercados de telefonia e tablets. Por que você mudou de ideia?
O que aconteceu foi que nós conseguimos mudar as regras do jogo. Enquanto você dependia de uma stylus (caneta) para escrever nos tablets o mercado não fazia sentido. A escrita é a forma mais lenta de se incluir informação em uma interface. Os tablets eram todos baseados em PCs, com sistemas operacionais lentos e baterias fracas.

Quando você pensou no iPad?
Vou contar um segredo. Na verdade, o projeto do iPad surgiu antes do iPhone. Eu comecei com o tablet no início de 2000 com a ideia de uma interface sem teclado e sensível ao toque. Um dos nossos projetistas abraçou a ideia. Algum tempo depois me apresentou um protótipo bem precário de um telefone. Foi aí que eu disse: "meu Deus, podemos fazer um telefone". Neste momento o projeto do tablet, que seria o iPad, foi para a prateleira, porque o telefone era mais importante.

Com o lançamento do iPad vem a pergunta da substituição. As pessoas não irão carregar mais um aparelho. O iPad vai substituir o computador?
Vamos pensar em uma analogia. Quando a economia era baseada no campo, os caminhões eram o meio de locomoção porque era o que as pessoas precisavam naquele momento. Com a mudança para a economia urbana, os carros rapidamente superaram numericamente os caminhões. Os computadores pessoais são os caminhões. As pessoas vão migrar para os tablets como modo de interação e os PCs serão menos numerosos que os tablets. Em caminhões e carros a proporção é cerca de um para cada seis e a relação PC tablet deve ser essa no futuro. Eu sou ironizado por me referir ao iPad como algo mágico. É porque realmente acho. É como se ele tivesse tirado um intermediário que existia entre o usuário e o conteúdo tornando tudo integrado e intuitivo, não sei se era o teclado, o monte de fios e coisas que se conectavam, mas a experiência mudou.

Vocês têm sido criticados por rejeitar aplicativos na App Store. Ninguém é obrigado a vender qualquer coisa. Qual o ponto negativo de crescer e começar a negar coisas que causam riscos ou são politicamente incorretas?
Nós focamos em aplicativos 'open source', como a plataforma do HTML5 que é totalmente aberta, e temos a App Store que funciona como uma curadoria. Nós aprovamos 95% dos aplicativos submetidos em até sete dias e recebemos uma média de 20 mil por semana. Tínhamos e temos uma regra clara que é a da não difamação de pessoas. Nenhum aplicativo pode difamar qualquer pessoa, e o que aconteceu foi que os cartunistas políticos caíram nesta regra, o que é errado. Então mudamos a regra. Mas neste meio tempo, um cartunista ganhou um prêmio Pullitzer e quando perguntaram porque o seu conteúdo não estava na App Store, ele respondeu prontamente para todos na sua coletiva que havia sido rejeitado. Nós somos, sim, culpados de errar em algo que ninguém havia feito antes, mas estamos aprendendo e resolvendo os problemas que aparecem.

Vocês vão entrar no mercado de publicidade?
Sim. Para ajudar os desenvolvedores de aplicativos para iPhones e iPads a ganhar dinheiro. Nós não vamos fazer fortuna com isso.

Mas já existem empresas fazendo isso, como o Google. Por que entrar?
Porque quem está fazendo está fazendo errado. O consumidor não quer clicar em um banner e ser arremessado para fora do seu aplicativo e depois não saber voltar ou ter que reiniciar tudo. E se você estiver no meio de um jogo, vai clicar e perder o jogo? Nós acreditamos que a experiência publicitária tem que acontecer dentro do aplicativo, para gerar interação e conforto para o consumidor.

Mas não acha que tem gente capacitada no mercado?
Sim, mas não fizeram. Então nós fizemos.

Como é o novo iPhone?
Eu já fui criticado por falar mais do que deveria e as pessoas na Apple têm uma frase para isso. "Não é inusitado um navio que vaza pelo topo".

Fonte: Redação Terra
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